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Nota Técnica sobre trabalho seguro, proteção à saúde e direitos dos agentes comunitários de saúde no contexto da pandemia de Covid-19.
Rio de Janeiro, 20 de julho de 2020
Assunto
As questões objeto desta Nota Técnica foram divididas em dois grupos. O primeiro abrange contraposições às ações discriminatórias sofridas pelos agentes comunitários de saúde (ACS) quanto à garantia dos direitos associados ao trabalho e aos argumentos que buscam sustentá-las; o segundo enfoca a organização do trabalho do ACS na vigência das condições sociossanitárias decorrentes da pandemia de Covid-19. Ao primeiro caso, apresentam-se contra-argumentos e ao segundo, uma contextualização e recomendações.
Apresentação
No contexto da pandemia de Covid-19, síndrome associada ao novo coronavírus SARS-CoV-2, professores e pesquisadores da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz), que acompanham o trabalho dos ACS, têm tido acesso a informações e dados de pesquisa sobre ações discriminatórias dirigidas a esses trabalhadores e aos argumentos que as sustentam. Tais ações dizem respeito principalmente aos direitos associados ao trabalho, ao acesso aos equipamentos de proteção individual (EPIs) e às condições de proteção aos ACS, notadamente aqueles cujo perfil de risco os torna mais vulneráveis. Tendo em vista a diversidade do panorama soociossanitario brasileiro e o curso singular da pandemia em cada local e a cada fase, a EPSJV/Fiocruz apresenta esta Nota Técnica, a fim de fundamentar a adoção de medidas que promovam o trabalho em condições de segurança e a garantia dos direitos associados ao trabalho.
Há que se observar que a situação particular das condições de trabalho dos ACS é tributária do processo de precarização do trabalho no Sistema Único de Saúde (SUS) que tem fragilizado o conjunto de seus trabalhadores, com efeitos distintos em relação às categorias profissionais e seus âmbitos de atuação. Tal processo é anterior ao contexto pandêmico e abrange questões relativas ao financiamento, à gestão, às formas de contratação e ao modelo de atenção.
Dados preliminares de pesquisa sobre as condições de trabalho e a formação de ACS no contexto da pandemia de Covid-19 (NOGUEIRA et. al., 2020) revelam a insuficiência quantitativa e qualitativa dos EPIs fornecidos, em especial máscaras e álcool em gel a 70%, contribuindo para dar visibilidade à precarização e à insegurança que afetam os ACS.
As questões objeto desta Nota Técnica foram divididas em dois grupos. O primeiro abrange contraposições às ações discriminatórias sofridas pelos ACS quanto à garantia dos direitos associados ao trabalho e aos argumentos que buscam sustentá-las; o segundo enfoca a organização do trabalho do ACS na vigência das condições sociossanitárias decorrentes da pandemia de Covid-19. Ao primeiro caso, apresentam-se contra-argumento e ao segundo, uma contextualização e recomendações.
I – Sobre ações discriminatórias quanto à garantia dos direitos dos ACS e os argumentos apresentados:
- Os ACS não seriam trabalhadores da saúde e, por isso, não teriam direito ao afastamento remunerado do trabalho ou à licença remunerada.
- Os ACS não atuariam na linha de frente do combate à Covid-19 e, por isso, não teriam direito aos EPIs.
O reconhecimento dos ACS como trabalhadores da saúde
Os agentes comunitários de saúde integram o SUS desde 1991, atuando no campo da Atenção Básica, em específico na Estratégia Saúde da Família (ESF). São trabalhadores da saúde cuja profissão foi criada em 2002, por meio da lei no 10.507 (BRASIL, 2002), que definiu o SUS como âmbito exclusivo para o seu exercício profissional, reconhecendo nos termos da lei o que se constatava na prática. Desde 2006, o trabalho de ACS tem como referência a lei no 11.350 (BRASIL, 2006), modificada em 2018 pela lei no 13.595 (BRASIL, 2018), cujas disposições abrangem os pré-requisitos para a profissão e suas atribuições.
Além dessa legislação federal, o trabalho de ACS é normatizado pela Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) cuja versão mais atual foi publicada por portaria em 2017 (BRASIL, 2017). Apesar de estar em um plano normativo inferior – portaria ministerial – em relação às leis 11.350 e 13.595, a PNAB apresenta efeito político importante, pois estabelece os princípios, diretrizes e orientações para a organização dos serviços, das práticas e do trabalho na AB. Nela definem-se as atribuições dos diversos trabalhadores que integram as equipes da ESF, dentre os quais os ACS, caracterizando a sua inscrição no plano de trabalho da AB.
Do ponto de vista normativo-legislativo, não resta dúvida de que o ACS é um trabalhador do campo da saúde.
Sobre a atuação dos ACS na linha de frente do combate à Covid-19
Os ACS atuam nas equipes de saúde da família que integram a rede de serviços da AB, localizados nos territórios mais expostos às condições de desigualdade socioeconômicas, o que determina prejuízos à proteção contra o novo coronavírus (SARS-CoV-2) e acarreta maiores níveis de contaminação, como demonstra o estudo EPICOVID19-BR de Hallal et al. (2020). Integram esse contexto social obstáculos ao acesso a serviços e ações para os cuidados necessários frente à pandemia de Covid-19, conforme indica Santos (2020). As Unidades Básicas de Saúde (UBS) têm tido papel importante na identificação de casos suspeitos e na busca de encaminhamento para serviços de referência, que ofereçam melhor suporte ao agravamento dos casos. Essa ação as coloca diante de dificuldades dado o número insuficiente de profissionais e de testes para a detecção da infecção, bem como as restrições ao acesso à rede de serviços especializados e à internação.
No contexto pandêmico, os ACS têm desempenhado um papel relevante na vigilância em saúde, contribuindo para a identificação de casos e o monitoramento de suspeitos, confirmados e contatos (REDE APS, 2020). Além disso, produzem informações de modo oportuno e confiável que alimentam o fluxo de dados dos sistemas de informação. Destacam-se no processo de educação em saúde e mobilização popular, no sentido da construção de alternativas sensíveis e mais apropriadas à realidade dos territórios. Têm sido também um importante articulador de ações solidárias, interinstitucionais e intersetoriais.
Em 8 de julho de 2020, a lei federal no 14.023 reconheceu os ACS como profissionais “essenciais ao controle de doenças e à manutenção da ordem pública”, incluindo-os em uma lista que enumera diversos outros trabalhadores da saúde e de outras áreas comprometidas no combate à Covid-19 (BRASIL, 2020a).
O exercício de tais atividades caracteriza o ACS, de modo irrefutável, como trabalhador da saúde atuante na linha de frente do combate à pandemia da Covid-19, o que foi confirmado em legislação federal.
II – Sobre as condições para a atuação dos ACS
Atividades nas Unidades Básicas de Saúde
O fluxo de pessoas às unidades de saúde exige que todos os trabalhadores sejam protegidos adequadamente e que tanto a circulação quanto o espaço físico se organizem de modo a minimizar o risco de contaminação pelo coronavírus. O fornecimento adequado e suficiente de EPIs e a garantia de condições de higiene e de saneamento são medidas indispensáveis de proteção ao conjunto dos trabalhadores e usuários de todas as unidades de saúde, dentre as quais as UBS.
Regularmente, nas UBS são exercidas atividades de acolhimento e triagem que, no contexto pandêmico, tendem a se intensificar e a oferecer maior risco. Para a organização do trabalho e maior segurança dos trabalhadores, cabe diferenciá-las. O acolhimento é responsabilidade de todos os profissionais, mas os ACS têm tido papel destacado em sua execução. Consiste na escuta do usuário e na coleta de informações, sejam dados gerais, sejam queixas, direcionando particular atenção para sintomas associados à infecção pelo coronavírus.
A triagem não é atribuição do ACS, e sim da equipe de enfermagem. Compreende a investigação de sinais e sintomas e, usualmente, estabelece classificação ou estratificação de risco, devendo ser realizada em espaço diferenciado do acolhimento.
A seguir, apresentamos recomendações apoiadas nas notas técnicas publicadas pela Anvisa (BRASIL, 2020b) para os serviços e os profissionais de saúde.
Recomendamos às unidades de saúde que:
- Forneçam aos ACS, em todas as atividades na UBS, em especial no acolhimento, EPIs em quantidade e qualidade adequadas, principalmente a máscara cirúrgica.
- Ofereçam treinamento para o uso dos EPIs e meios apropriados para o descarte do material utilizado.
- Disponibilizem, de modo regular, condições para a higienização das mãos, com água e sabão e álcool em gel a 70%.
- Garantam o distanciamento físico de pelo menos um metro e a ventilação no espaço de trabalho.
- Organizem escalonamento entre os ACS, sobretudo se o espaço físico for restrito, de modo a evitar aglomeração e a respeitar o distanciamento físico de pelo menos um metro.
- Disponibilizem máscaras aos usuários durante a sua permanência na unidade.
- Os casos que, no acolhimento, forem identificados como suspeitos de Covid-19 sigam para a triagem clínica, em um fluxo diferenciado dos demais.
- A permanência dos casos suspeitos na unidade se dê em espaço próprio, preferencialmente composto de sala de espera e banheiro exclusivos, de acordo com as medidas de higiene e o afastamento físico necessários.
Atividades nos territórios
Os ACS realizam atividades regulares nos territórios de abrangência das UBS, dentre as quais se destacam a visita domiciliar (VD) e o cadastramento de novos moradores. Como moradores locais, o território é também o espaço de deslocamento entre a sua casa e o trabalho, momento no qual é comum que esse trabalhador seja abordado por usuários que acompanha, em busca de informações e orientações. O território, portanto, se configura em um local de trabalho para o qual também devem ser previstas medidas de proteção. No contexto da Covid-19, além de tais medidas, recomenda-se a redução do trânsito dos ACS no território, especialmente a ida às casas dos moradores.
A definição de critérios de acompanhamento e periodicidade do contato do ACS com usuários nos territórios deve ser ancorada em pactuações com a equipe, levando-se em consideração as condições que produzem vulnerabilidades na população (físicas, sociais, emocionais, econômicas e sanitárias), bem como a manutenção de um volume de trabalho que não acarrete danos à saúde dos ACS.
Visitas domiciliares
A realização das atividades nos territórios, em especial a VD, deve estar condicionada à garantia de medidas de segurança do profissional e da pessoa atendida, que repercutem na segurança da coletividade. São elas:
- A redução das VDs presenciais, priorizando-se os usuários de maior risco, bem como as famílias que passem por processos de vulnerabilização específicos, agravados pela condição de isolamento, como violência familiar e insuficiência ou ausência de renda.
- A VD e outras atividades no território devem se limitar à área peridomiciliar (frente, lados e fundo do quintal ou terreno).
- Nos casos em que for imprescindível o ingresso do trabalhador no domicílio, o que pode pode ocorrer no acompanhamento de usuários acamados ou com restrição de deambulação, o ACS deverá fazê-lo com o equipamento de proteção individual adequado fornecido pela UBS e em acordo com a sua equipe.
- A UBS deve disponibilizar máscara de proteção a ser entregue pelo ACS à pessoa atendida/acompanhada, em qualquer circunstância de contato.
- A UBS deve prover ao ACS máscaras cirúrgicas em quantidade e qualidade apropriadas e orientá-lo quanto à observação do distanciamento mínimo de um metro para a realização de suas atividades.
- A UBS deve disponibilizar álcool em gel a 70% para a higienização das mãos, de forma que o ACS possa portá-lo quando for realizar as VDs.
Cadastramento de novos usuários
O cadastramento de novos moradores, em seu formato tradicional, é uma atividade que prevê interação prolongada, visando ao levantamento e registro de informações sobre as condições de vida e saúde de famílias que os agentes desconhecem. Trata-se, portanto, de uma atividade cujo risco de contaminação é mais elevado.
Por esse motivo, indicamos que, na vigência da emergência sociossanitária provocada pela Covid-19, o cadastramento seja radicalmente reformulado. Em primeiro lugar, ressalta-se que as UBS devem aprofundar a perspectiva de ampliação do acesso aos cuidados de saúde. Em consequência, o cadastramento prévio não pode ser condição para o atendimento dos casos de demanda espontânea.
A diretriz fundamental para a modificação desse procedimento é a eliminação ou redução das circunstâncias que oferecem maior risco de contaminação, dentre as quais destacam-se: circulação no território e atividades que prevejam contato face a face por tempo prolongado, ingresso em áreas fechadas (domicílios, por exemplo), manuseio de papéis e/ou documentos e o repasse de dados mediante o deslocamento para a unidade, seja dos usuários, seja dos ACS.
Deve-se ter em consideração que os ACS são profissionais que conhecem as realidades de seus territórios – que, no país, são muito diversas –, em particular de suas microáreas de atuação. Conhecem também recursos sociais que podem ser mobilizados para viabilizar a redução de riscos. Há inúmeras iniciativas comunitárias de resposta à pandemia, que explicitam a capacidade de criar novas formas de articulação e que tendem a ser conhecidas pelos ACS. Por isso, é fundamental que os ACS sejam sujeitos influentes no delineamento de ações que impactam suas atividades, assim como é fundamental que os gestores tragam para si, na reorganização do processo de trabalho, a responsabilidade de manter como princípio a proteção do trabalhador e da coletividade. Desse modo, é igualmente necessário que a manutenção do cadastramento não implique desrespeito ao limite máximo de 750 pessoas por ACS, conforme estabelece a PNAB (BRASIL, 2017).
Em seguida, apresentam-se algumas indicações para a reorganização do cadastramento, cuja pertinência deve ser localmente avaliada:
- Utilização de meios coletivos de divulgação (carro de som, rádio comunitária, mensagem por aplicativos) por lideranças locais e/ou profissionais de saúde da UBS, abordando com clareza o que é o cadastramento, informando os documentos necessários e apresentando condições, tais como o uso de máscara pelo usuário e pelo ACS, no caso de haver necessidade de contato pessoal.
- Construção de alternativas para realizar contato, por celular ou aplicativo de mensagem, com os novos moradores, de modo a efetivar parcial ou integralmente o cadastramento por meio remoto. Mesmo nos casos em que o cadastro só possa ser parcialmente realizado por esta via, tal medida busca reduzir o período de tempo do contato pessoal.
- Distanciamento físico de pelo menos um metro, quando esse contato presencial for inevitável. O ACS deve portar os EPIs necessários e dispor de máscara para uso pelos moradores, durante esse contato.
- Realização dos contatos pessoais, tal como na VD, no peridomicílio.
- Ativação de mecanismos de transmissão eletrônica para as UBS dos dados de cadastramento coletados, evitando-se qualquer ida desnecessária à UBS.
- Redução provisória, por parte do Ministério da Saúde, dos dados necessários para a validação do cadastro de usuários, enquanto persistirem os riscos decorrentes da pandemia de Covid-19.
Cabe lembrar que, segundo a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT (BRASIL, 1943), o não cumprimento das disposições legais e regulamentares sobre segurança e medicina do trabalho acarretará ao empregador a aplicação das penalidades previstas na legislação pertinente.
Organização de atividades de modo remoto
Em territórios de grande densidade populacional ou naqueles de baixa densidade, onde, na prática, não estejam vigorando as recomendações de distanciamento físico, a circulação dos ACS nesses territórios coloca-os em situação de grande exposição e, ao mesmo tempo, torna-os potenciais propagadores do novo coronavírus. Agrega-se o fato de persistirem as dificuldades de acesso dos ACS a EPIs em quantidade e qualidade adequadas. Nesse contexto e tendo em vista a alta transmissibilidade desse vírus por via aérea, enfatiza-se a necessidade de se viabilizar a realização de atividades de modo remoto. Considera-se aqui a importância das atividades educativas, da vigilância em saúde e do acompanhamento das condições de saúde preexistentes ou agravadas no contexto da pandemia.
Em função desse cenário, recomenda-se:
O teletrabalho como meio temporário de manutenção das atividades essenciais desempenhadas pelos ACS nos territórios.
O teletrabalho do ACS deve ser organizado, preferencialmente, na residência do trabalhador. Assim, minimiza-se a necessidade de seu deslocamento e permanência na UBS e, em consequência, a sua exposição ao risco e à propagação do vírus na comunidade. Somente quando esta recomendação não for possível, o trabalho remoto deverá ser feito na unidade de saúde.
Para a realização do teletrabalho na residência do ACS, recomenda-se:
- A observância do horário de expediente da UBS e o respeito à carga horária diária e semanal do ACS.
- A disponibilização de aparelho móvel com linha telefônica e rede de acesso à internet, custeadas pela UBS. A linha telefônica deve ser comercial, programada para emitir recomendações automáticas padronizadas, com número telefônico de emergência, após o encerramento do expediente da UBS e do trabalho do ACS.
- O uso de listas de transmissão de mensagens simultâneas para contato dos ACS com os usuários sob seu acompanhamento.
Independente do local onde será realizado o teletrabalho, recomenda-se:
- A manutenção integral dos vencimentos pagos aos ACS.
- A observância da carga horária diária e semanal de trabalho.
- A redução da jornada de trabalho, quando possível, considerando a predominância de mulheres entre os ACS e o agravamento da sobreposição de atividades de trabalho, familiares e domésticas, no contexto de distanciamento social, decorrente da suspensão de diversos serviços, entre os quais os escolares.
- A garantia de suporte técnico às ações de vigilância, por meio da definição de profissional de referência, médico e enfermeiro.
- Informação à população, pela UBS e demais autoridades sanitárias locais, sobre a finalidade exclusiva do contato remoto do ACS para as atividades de acompanhamento e vigilância, incluindo a busca de casos e contactantes e o acompanhamento da evolução dos casos sintomáticos para acionamento da equipe médica responsável. É necessário evitar que a população confunda essa forma de comunicação com um serviço de suporte para situações de emergência.
Sobre trabalhadores com condições de risco aumentado
Os trabalhadores que apresentem condições de risco aumentado para complicações devido à Covid-19 têm direito a medidas diferenciadas que evitem a sua exposição à contaminação. Em vista disso, é necessária a garantia do exercício do trabalho em locais e em condições de menor risco, sem consequências indevidas aos trabalhadores (CNS, 2020).
No presente momento, julho de 2020, são considerados grupos de risco pessoas acima dos 60 anos e aquelas em condições de saúde tais como: diabetes; doenças cardiovasculares, como hipertensão; doenças respiratórias agudas ou crônicas, como bronquite e asma; doença renal crônica; baixa imunidade causada, por exemplo, pelo tratamento contra o câncer e outras enfermidades; gestação e puerpério. A obesidade vem sendo identificada como uma comorbidade associada ao agravamento do quadro, especialmente entre jovens sem outras comorbidades e, portanto, deve ser considerada (BRASIL, 2020c).
Note-se que os ACS são trabalhadores que, em sua maioria, compartilham as mesmas condições de vida e de saúde de grande parte dos usuários exclusivos do SUS, compondo famílias de baixa renda, mais expostas ao desemprego e ao trabalho precarizado. Muitas vezes, habitam territórios marcados pela ausência ou insuficiência de saneamento básico e acesso à água tratada, em moradias com condições precárias, lidando com importantes obstáculos para atender às orientações de distanciamento físico.
Considerando tais características e o fato de que o seu deslocamento ao trabalho enseja contatos com os usuários em busca de informações, recomenda-se que os ACS que apresentem condições de risco aumentado à Covid-19 tenham o direito de permanecer em casa e realizar suas atividades por meio do teletrabalho.
Considerações finais
Para além das medidas protetivas de caráter operacional, deve-se considerar as necessidades produzidas pela carga de desgaste psíquico agravada pelo contexto pandêmico. Os ACS, por sua condição social e vinculação com pessoas particularmente vulneráveis, tendem a ser acentuadamente afetados. Isto posto, é importante que as UBS possam ser não somente o espaço de trabalho, mas também o espaço de cuidado, seja diretamente, seja a partir da referência para a rede de atenção especializada.
De modo complementar às dimensões do cuidado, é necessário que as Secretarias de Saúde assumam a responsabilidade por ofertar ações de educação permanente para a atualização dos trabalhadores da saúde em geral e dos ACS em particular, frente às questões da Covid-19. A compreensão das dimensões clínica, epidemiológica, de biossegurança, bem como dos aspectos específicos, como protocolos relativos ao exercício da vigilância ativa e das ações de educação em saúde são elementos necessários não apenas para o exercício profissional, mas para reduzir o estresse produzido pela desinformação e pelas incertezas que permeiam a pandemia.
Por fim, assinala-se que esta nota particulariza situações relativas à experiência de trabalho dos ACS. Contudo, entende-se que a reafirmação dos direitos desse trabalhador coincide com a reafirmação do direito da classe trabalhadora a um Sistema de Saúde integralmente público, universal e igualitário e por condições dignas de trabalho.
Referências
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BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União, Brasília, 2017, p.1. Disponível em: <https:// http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&data=22/09/2017&pagina=68>. Acesso em: 20 jul. 2020
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Elaboração
Márcia Valéria Morosini
Angelica Ferreira Fonseca
Mariana Lima Nogueira
Camila Furlanetti Borges
Cristina Massadar Morel
Monica Vieira
Filippina Chinneli